O Crisma
- André Duarte
- 11 de abr. de 2018
- 2 min de leitura
Atualizado: 13 de abr. de 2018
Eu fiz o Crisma. Na minha altura fazia-se o Crisma. Era um percurso quase religioso. A escola porque era lógico, a catequese porque era assim. Fiz o Crisma e não sei porquê, alias, até sei, por uma questão de gestão e racionalidade que não de ordem religiosa e sim temporal. Em pequenos somos católicos antes de sermos pequenos, crescemos e é só confirmar, para isso, serve o Crisma. Tudo movido pela lógica de “Basta rubricar em baixo”.
O essencial é fazer o Crisma, questões de compreensão são meramente pró- forma. No dia do veredito o nosso entendimento revê-se no acertar, em consonância com os demais, na altura de dizer “Sim, Creio” ou “Não, Não Creio”, tudo em voz alta, sem rodeios ou medos. Estamos ali para crer, não sabendo quando, aguardamos que os restantes creiam e em pouquíssimo tempo, creio eu, o vizinho, a fila de trás, os pais, o padre, o bispo, tudo em uníssono, numa homogénea profusão. No final, extenuados, tiramos fotografias e vamos para casa comer.
O essencial é fazer o Crisma, perceber fica para uma altura em que compreendamos mais e creiamos menos. Sinceramente, nem sempre assim pensara. Fiz o Crisma aos 17, podia ter acontecido aos 13, mas só aos 14 se está preparado, diziam. O Crisma é o ano bissexto da religião, só acontece quando há Bispo e só há Bispo quando há. Que pena não fazer 14 um dia antes de haver Bispo, pensava. Foi-me negada a confirmação quando eu queria confirmar, foi-me possível quando eu a queria despachar. Coisas da Igreja. Do Altíssimo dos meus 13 anos, quando temos a razão do mundo, senti, talvez, pela primeira vez a indignação de adulto. De todos, apenas um amigo meu estava preparado para a respeitabilidade do ato, tinha 14. Aos 18 tive a carta, levou meses, aos 17 o Crisma, demorou anos. A Carta ainda uso.
André Duarte



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